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RESERVAS

Bacia do Rio Paraná também tem o seu ‘Pantanal’

13 JUL 2017 - 20h42Por Sílvio Andrade, com informações de Edmir Conceição

Criada em 1993, como parte das compensações ambientais que a Companhia Energética de São Paulo (Cesp) foi obrigada a cumprir por inundar milhares de hectares do lado de Mato Grosso do Sul com a instalação do lago artificial de Porto Primavera, a unidade de conservação Cisalpina, em Brasilândia, tem as características do Pantanal. Integra um complexo ambiente natural entre os dois estados banhados pelo Paranazão.

O ainda desconhecido Pantanal do Leste pelos turistas, como se diz na região, é formado por várzeas, alagados, vegetação, savanas e cerrados, um ambiente de solo, água, fauna e flora que se assemelha ao bioma pantaneiro. Uma foto aérea desse paraíso, banhado pelos rios da Bacia do Rio Paraná, confunde até mesmo os mais catedráticos estudiosos da maior área alagável do mundo.

Transformada oficialmente em Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) somente no ano passado, por resolução do Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), Cisalpina é hoje uma das unidades mais conservadas do Estado. Além da gestão da Cesp, existe uma ação muito forte da Polícia Militar Ambiental (PMA) no combate à caça e pesca.

Último refúgio

O Pantanal Leste, na verdade, é um mosaico ecológico criado e mantido pela companhia paulista e ocupa uma porção dos territórios das cidades de, Naviraí, Taquarussu, Jateí e Brasilândia (MS), São João do Pau D´Álho, Dracena, Ouro Verde, Presidente Venceslau, Piquerobi, Guaracaí, Castilho, Paulicéia e outros municípios paulistas, totalizando 110 mil hectares.

Complexo ambiental influenciado pelo Paraná, entre MS e SP, tem características idênticas ao Pantanal: um chamariz ainda não descoberto pelo turismo

Nasceu em razão do represamento do Rio Paraná e afluentes – medida polêmica na época, anos de 1980/90 – para construção de usinas hidrelétricas, quando foram expulsas centenas de famílias de pescadores, sitiantes e ceramistas, um impacto social sem precedentes.

Do lado de Mato Grosso do Sul, ainda foi criado, em 1998, o Parque Estadual do Ivinhema, o primeiro do Estado, com 73 mil hectares. Seus varjões compreendem o último trecho livre de represamento do Paraná e protege refúgios de espécies animais e vegetais do cerrado de floresta estacional.

“A Cisalpina é a reserva mais conservada que temos”, atesta Leonardo Tostes Palma, gerente de unidades de conservação do Imasul, explicando que sua regulamentação definitiva arrastou-se por mais de uma década por problema de documentação das posses, legislação conflitante e de grilagem.

Cisalpina: savanas permanentemente alagadas

A intocabilidade do local, no entanto, está sendo ameaçada pela estrada que cruza a área ligando Braslândia a Panorama (SP). Segundo Palma, apesar da boa sinalização, o intenso fluxo de veículos tem causado a morte de animais silvestres, como anta e cervo. A presença humana também é causadora de grandes incêndios, alguns espontâneos.

Ganho ambiental

Segundo estudos, Cisalpina, distante 14 km de Brasilândia, é um dos últimos redutos do cervo-do-pantanal fora do Pantanal. É um bioma que apresenta mosaico de floresta estacional decidual aluvial; savana arbórea (cerradão); savana (cerrado) e campos de várzea.

É uma extensa várzea inundada periodicamente na épocas das chuvas, com um complexo sistema de lagoas, córregos e canais interligados entre si e ao canal do Rio Paraná.

Seus 3.867 hectares formam um ambiente fluvial que, no passado, sofreu abandono gradativo e consequente ressecamento, motivados por processos climáticos e geológicos. Isso provocou um deslocamento da calha principal do Paraná para a margem esquerda. Devido a esse fato, é possível identificar na paisagem da reserva antigos canais utilizados pelo rio que remontam a um período de 10 mil a 40 mil anos,.

Levantamentos realizados por pesquisadores do campus da Universidade Federal de MS (UFMS) em 2011 apontaram que a proteção dessa área e o trabalho de recuperação e educação ambiental representam um ganho ambiental importante, sobretudo nesta região do Estado em que as áreas nativas têm perdido espaço rapidamente com o avanço do agronegócio.

A formação das unidades de conservação imposta à Cesp impediu a extinção de algumas espécies de animais e aves

Água e carbono

Nos últimos anos, ocorreu um significativo aumento no número de visualizações de pegadas de animais silvestres e até visualizações de animais adultos e de filhotes, mostrando que área está reunindo condições adequadas para a procriação de algumas espécies. Entre elas os estudos citam a anta, cervo-do-pantanal, onça parda, queixadas, capivaras, jacarés-de-papo-amarelo, tamanduás e também uma grande quantidade de aves, como tuiuiús, garças e biguás.

Cisalpina é um dos últimos remanescentes significativos das formações vegetais características da planície aluvionar do rio Paraná no trecho compreendido entre os municípios de Três Lagoas e Rosana (SP), com extensão de cerca de 300 quilômetros.

Como zona úmida, a reserva está entre os ambientes mais produtivos do mundo, que são considerados armazéns naturais da biodiversidade. Além disso, as zonas úmidas proporcionam sistemas de apoio à vida para grande parte da população ribeirinha, cumprindo funções ecológicas fundamentais como reguladora dos regimes hidrológicos e como formadora de um rico hábitat.

Contribui também para a estabilidade climática, por meio de seu papel nos ciclos globais de água e carbono, constituindo-se em um recurso de grande importância econômica, cultural, científica e recreativa.

Um fator de especial relevância é seu papel como abrigo de importantes parcelas das populações de espécies ameaçadas de extinção e impactadas pela formação do reservatório da Hidrelétrica Sérgio Motta.

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