quinta, 02 de maio de 2024
DESCASO

SEM APOIO, LANCHEIROS DESOBSTRUEM RIO DO PANTANAL APÓS 90 DIAS

25 ABR 2023 - 10h13Por SILVIO DE ANDRADE

Sem apoio das esferas governamentais – federal, estadual ou municipal -, lancheiros que fazem o transporte de cargas em geral, gado e pessoas entre Corumbá e a região do Taquari, nos pantanais da Nhecolândia e Paiaguás, conseguiram liberar o leito do Rio Negrinho, entupido por plantas aquáticas e gramíneas, lutando sozinhos e com recursos próprios por mais de 90 dias para tirar a região do isolamento.

O Negrinho recebe as águas do novo leito do Taquari e desagua no Paraguai-Mirim, e este, no Rio Paraguai, perto da cidade. O entupimento (fenômeno natural) interrompeu a navegação de barcos e lanchas, isolando as comunidades tradicionais e algumas fazendas, paralisando também as escolas. Os acessos por terra foram inundados pelo transbordamento dos rios e chuvas acima da média.

lancheiros e moradores da região se uniram para desbloquear o rio, um trabalho manual que debandou mais de 90 dias. Fotos: Divulgação

“Cansamos de pedir ajuda das autoridades, ninguém se manifestou, é revoltante”, reclama o lancheiro Jocy Lopes Nascimento, conhecido como Jlopes. “Gastei dinheiro do meu bolso, sem faturar um frete desde fevereiro. A região estava isolada, ninguém saia, ninguém entrava, uma situação de calamidade. Vejo isso como um descaso das autoridades”, protesta.

Trabalho é braçal e lento

A travessia do sinuoso Negrinho (sem leito) sempre foi um desafio, devido a passagem estreita, pressionada pelos camalotes, e quem não conhece a região se perde no labirinto que se forma cercado pela planta. Em compensação, a água é cristalina, de se enxergar o fundo e os peixes.

Sem equipamentos apropriados, lancheiros conseguiram vencer o camalote

Jlopes atua no setor de transportes há mais de 30 anos e nunca presenciou uma situação tão crítica como neste ano, com a subida das águas na região depois de vários anos de seca. Ele disse que está recebeu apoio de alguns amigos e usuários da via, como os ribeirinhos, para conseguir realizar o serviço, estimando um gasto de R$ 150 mil.

O lancheiro contratou vários ajudantes, pagando 120 reais a diária, para auxilia-lo a retirar a vegetação flutuante acumulada na superfície – um trabalho manual, cansativo e lento, com o uso da âncora (poita) da sua embarcação. O camalote retirado era picotado na foice e jogado na correnteza, em direção ao Paraguai-Mirim.

Ahipar não dá apoio

Segundo Lopes, a área obstruída pela vegetação aquática estendeu-se por mais de 10 quilômetros, mas nesta semana, conforme estimou, o trabalho foi concluído e a vida voltou ao normal para os moradores do Taquari - a maioria colonos, que dependem do acesso para abastecimento, principalmente de alimentos, adquiridos na cidade. 

Empresa federal de gestão da bacia do Rio Paraguai, a Ahipar é acusada de omissão no socorro aos usuários e moradores do Taquaei

A situação de calamidade no Taquari levou a Câmara de Vereadores de Corumbá a pedir o retorno da sede da Ahipar (Administração da Hidrovia do Paraguai) para o município. Transferido em 2019 para Campo Grande, o órgão vinculado ao Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte) substituiu a antiga agência da Portobras (extinta no governo Fernando Collor) e tem autoridade na bacia do Rio Paraguai.

O presidente do legislativo municipal, Ubiratan Canhete Campos Filho, argumenta que a Ahipar sempre atuou na desobstrução dos trechos entupidos pela vegetação aquática no Rio Paraguai e seus afluentes para atender os ribeirinhos e o transporte fluvial, e acusa o órgão de omissão.

“A Ahipar deixou de cumprir suas atribuições depois que mudou o escritório para a Capital”, afirma. “Toda vez que os usuários da hidrovia necessitam de apoio a Ahipar demora a intervir ou não se manifesta. O órgão tem hoje um corpo técnico que desconhece a nossa região.”
 

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