sábado, 18 de maio de 2024
CORUMBÁ

AUDIÊNCIA PÚBLICA DÁ VOZ AO PANTANEIRO NA CRIAÇÃO DA LEI DO PANTANAL

27 AGO 2023 - 09h55Por ANTÔNIO CARLOS MIRANDA

A importância do homem pantaneiro na formatação de uma legislação específica para disciplinar a proteção e uso sustentável do bioma do Pantanal, ficou evidenciada durante audiência pública que lotou o plenário da Câmara de Vereadores de Corumbá.

O evento, uma iniciativa do vereador Chicão Vianna e referendada pelos demais pares do Poder Legislativo, reuniu pessoas ligadas aos segmentos da cadeia produtiva pantaneira, como pecuária, turismo, pesca e mineração, além de organizações não governamentais (ONGs), entidades de classe, pesquisadores, prefeitos, vice-prefeito, representantes do Governo do Estado, entre outros.

“Foi extremamente importante. Tivemos a oportunidade de debater questões fundamentais para que o bioma Pantanal continue forte, preservado, conservado, gerando emprego, renda e incrementando a economia das cidades pantaneiras, do Mato Grosso do Sul e do Brasil”, afirmou Chicão.

“Estamos agora trabalhando na formatação de um documento final que será encaminhado ao Governo do Estado e aos nossos parlamentares estaduais e federais, que servirá para enriquecer a lei estadual já anunciada pelo governador Eduardo Riedel, bem como uma futura lei ederal”, ressaltou o vereador.

 

Chicão entendeu a angústia dos pantaneiros, os pecuaristas locais, e que essas legislações não venham a prejudicar a economia da região e local, que é essencial, histórica e muito mobilizada. “Todos estão preocupados e o sentido disso é buscar uma legislação equilibrada para a preservação, como sempre foi feito”, continuou.

Pantaneiro preserva

Chicão lembrou que a audiência foi pensada a partir do momento em que tomou conhecimento de um projeto de lei que estava sendo elaborado pela deputada federal Camila Jara (PT), que dispunha sobre a conservação, a proteção, a restauração e a exploração sustentável do bioma pantanal, alterando a Lei 9.985/200, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza.

Vereador Bira, presidente do Legilativo Corumbaense

“Não sou contra, muito pelo contrário. Mas, o problema foi que alguns trechos do projeto resultariam em sérios problemas para o homem pantaneiro, com reflexos negativos na pecuária e mineração, principalmente, o que geraria sensível queda na geração de renda e emprego, afetando diretamente a economia das cidades pantaneiras”, explicou.

Por isso mesmo a audiência foi proposta e foi considerada de extrema importância. Depoimentos de representantes dos mais diferentes segmentos, mostraram que o homem pantaneiro sabe, como ninguém, preservar, conservar o ambiente, onde está há mais de 200 anos.

Todos foram unânimes em destacar que aproximadamente 90 milhões de quilômetros quadrados do bioma Pantanal está no Mato Grosso do Sul, e que, desse total, 85% estão preservados, coberto por vegetação nativa, que se divide em áreas florestais, savanas, campos alagáveis e brejos.

Gilson de Barros, presidente do Sindicato Rural de Corumbá

Só em Corumbá, maior município do bioma, são 2.134 propriedades rurais responsável por um rebanho em torno de 1,8 milhão de cabeça, o segundo maior do país, gerando renda e emprego para cerca de 15 mil pessoas e alimento para milhares de brasileiros e até do exterior.

Outras cidades pantaneiras estão no mesmo patamar. Juntas Corumbá, Ladário, Porto Murtinho, Miranda, Aquidauana, Rio Verde e Coxim, contam com 3.527 propriedades rurais e um rebanho bovino de mais de 3,8 milhões de cabeças.

Ouvir o pantaneiro

O prefeito de Aquidauana, Odilon Ribeiro, foi taxativo ao afirmar que o homem da terra sabe como ninguém, cuidar do que é seu. “Fora daqui quem é exemplo para nós? Canadá, Haiti, São Paulo, Rio? Não tem nenhum país ou estado que é exemplo para nós”, disse, se referindo ao bioma que tem 85% do bioma preservado.

Mas, fez uma cobrança para que invistam na região pantaneira, classificada por ele como a mais pobre do Estado, sem saneamento básico, principalmente, e que é preciso ouvir o pantaneiro antes de se pensar em qualquer lei em relação à região. Ele, inclusive, aproveitou a oportunidade para convidar os presentes para a Audiência Pública que será realizada pela prefeitura de Aquidauana nos próximos dias, sobre o mesmo assunto.

 

O vice-prefeito de Corumbá, Dirceu Miguéis Pinto, que representou o prefeito Marcelo Iunes, foi taxativo ao afirmar que o pecuarista pantaneiro segue à risca o que determina a legislação, se referindo ao decreto estadual  14.272. “Estão aqui há mais de 200 anos e eles são, realmente, quem preserva o nosso Pantanal”, simplificou, citando que precisam ser ouvidos sempre que se pensar em legislação específica para o bioma.

O presidente do Sindicato Rural de Corumbá, Gilson Araújo de Barros, disse que houve um retrocesso. Lamentou o fato de o decreto estadual não ter se tornado uma lei estadual, e que após oito anos, o assunto voltou à tona, e que “estamos aqui novamente discutindo regras para o desmatamento dentro do Pantanal. Isso traz uma insegurança jurídica muito grande”, citou.

“Ninguém investe em fazenda pensando em oito anos, o retorno é longo e precisa ter uma política que alcance a rentabilidade que a fazenda vai lhe trazer. É um investimento muito alto”, observou. Ele cobrou uma legislação específica, com toda segurança jurídica, para evitar prejuízos a planície pantaneira, que pode gerar desemprego, prejuízos financeiros, sociais e até ao estado, ao município e ao país, mas principalmente à população pantaneira.

Ele é a favor de se ouvir sempre o homem pantaneiro, posição reforçada pelo presidente do Sistema Famasul, Marcelo Bertoni, que destacou a importância do produtor rural para o bioma onde produz com sustentabilidade e contribui para que mais de 85% da vegetação nativa do bioma estejam preservados.

“Nosso Estado tem belezas naturais e tem produtores responsáveis. São 300 anos com o Pantanal preservado até hoje graças ao produtor rural pantaneiro. Mesmo com as autorizações e decretos dizendo que se podia muito mais, o produtor manteve 85% da vegetação nativa intacta”, completou.

Leonardo Pereira Gomes, da ONG SOS Pantanal, que trava uma luta contra o plantio de soja no Pantanal, foi outro que destacou a presença do pantaneiro na preservação da região, ressaltando que já fazem isso há mais de 200 anos. “É o bioma mais conservado do Brasil”, e que sabe inclusive, lidar com fogo, se referindo às recentes ‘batalhas’ contra as queimadas em solo pantaneiro.

 

Mineração e pesca

Outros assuntos abordados foram relacionados à mineração e à pesca, que também precisam de um tratamento especial na instituição da Lei do Pantanal, seja ela estadual ou federal. A mineração, por exemplo, é uma atividade forte na região, desenvolvida em uma área de somente 90 hectares, mas que gera 14 mil empregos e, em 2022, arrecadou R$ 46 milhões, com previsão de chegar a 80 milhões em 2023, sem contar o fato de que as mineradoras são obrigadas a cumprir uma legislação pesada.

Em relação ao escoamento da produção, a hidrovia é uma das alternativas viáveis, mas que esbarra no nível das águas do Rio Paraguai (o transporte ficou paralisado durante um bom tempo devido à seca), além do fato de que há necessidade de dragagem em vários pontos do Rio Paraguai que, desde 2019, enfrenta problemas com a saída da Administração Hidroviária do Paraguai (Ahipar) de Corumbá.

Sobre a pesca, um assunto lembrado na audiência, foi a lei municipal que proibiu a captura do dourado, espécie que estava em extinção, em 2012, por cinco anos, e depois em 2017, por 10 anos, mas que se tornou lei estadual somente em 2019. O tema foi levantamento pelo segmento pesqueiro para mostrar que o pantaneiro sabe como ninguém cuidar do seu ambiente. Mas, foi cobrada a liberação da pesca em unidades de conservação permanente, onde a atividade é proibida, dentro do Pantanal.

A mesa dos trabalhos da audiência pública contou com as presenças dos vereadores Chicão e Bira (presidente do legislativo municipal); prefeitos Fábio Santos Florença (Miranda) e Odilon Ribeiro (Aquidauana); vice-prefeito de Corumbá, Dirceu Miguéis; Dácio Queiroz, vice-presidente da Acrisul; José Anibal Comastri, pesquisador da Embrapa Pantanal; Eduardo Pereira, coordenador de mineração da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação; Pedro Mendes Neto, representante do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul), e Marcelo Bertoni, presidente do Sistema Famasul.

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