sexta, 26 de abril de 2024
INCÊNDIOS

20 mil animais morreram em reserva do Pantanal em 2020

12 JUL 2021 - 06h52Por CLEIDE CARVALHO/O GLOBO

Macaco-prego, queixada e jacarés foram as espécies de médio e grande porte com maior número de indivíduos mortos durante as queimadas de 2020 dentro da Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN) Sesc Pantanal (Poconé, Mato Grosso), que teve 93% de sua área atingida pelo fogo. Foram pelo menos 9.500 macacos-prego, 6.700 queixados e 3.600 jacarés que morreram.

O cálculo foi feito pelos pesquisadores do Grupo de Estudos em Vida Silvestre (GEVS) e é o primeiro resultado de um estudo sobre os impactos da queimada na propriedade, maior reserva particular do Brasil, quase do tamanho do município de São Paulo.

Não entram na conta milhares de serpentes, mamíferos e anfíbios de pequeno porte, que, pelo tamanho, foram totalmente carbonizados. Por isso, segundo os pesquisadores, não é possível sequer fazer estimativas destas mortes.

“Existe uma fauna esquecida, de pequenos mamíferos, roedores, marsupiais e lagartos. Eles foram terrivelmente impactados e o número de animais mortos é imenso, mas não é possível avaliar quantidades porque o fogo consome totalmente”, explica o biólogo Luiz Flamarion, pesquisador do Museu Nacional e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Para o estudo foram escolhidas 400 áreas da RPPN para contagem de carcaças e acompanhamento da fauna após a queimada, que consumiu a vegetação por 90 dias. Cerca de 50 pesquisadores percorreram a RPPN para identificação das carcaças. Foram identificadas 51 espécies. 

Fauna foge do calor intenso causado pelo fogo na Estrada-Parque, Pantanal da Nhecolândia, em Corumbá. Foto: Sílvio de Andrade

Herbívoros: impacto

Não foram localizadas carcaças de onças-pintadas. De onças pardas, foram localizadas quatro. Os flagrantes de monitoramento por câmeras mostram esses animais, topo da cadeia alimentar, queimados. Os pesquisadores acreditam que as onças tiveram mais condições de correr do fogo, para locais ainda não atingidos pelas chamas ou já queimados. Carnívoras que são, puderam ainda se alimentar dos demais animais mortos. Desta forma, os herbívoros foram mais afetados, devido à queima da vegetação.

Segundo Ismael Brack, doutorando em ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), nenhuma das demais teve tantos indivíduos mortos quanto as três espécies já estudadas. 

Durante o período da queimada, que atingiu um total de 17 RPPNs, sete terras indígenas e destruiu 80% do Parque Nacional do Pantanal mato-grossense, fazendeiros da região chegaram a criticar as áreas protegidas e afirmar que, por não terem gado, elas acumulariam enorme quantidade de vegetação seca, o que serviria para propagar ainda mais o fogo.

Os estudos mostraram o contrário. Nas áreas do entorno da RPPN Sesc Pantanal o fogo consumiu 16 mil hectares por dia. Dentro da reserva, foram bem menos: 2.300 hectares diários.

José Luiz Cordeiro, da Fiocruz, coordenador do estudo, explica que as áreas protegidas guardam enorme diversidade de flora e, além disso, a ação de brigadistas ajudou a retardar o avanço do fogo no Sesc Pantanal, permitindo a fuga de animais e, em alguns momentos, servindo de refúgio.

Entre setembro de 2020 e janeiro deste ano, foram instalados 178 pontos com água para os animais e 186 pontos de alimentação, que foram desativados à medida em que as visitas das variadas espécies diminuíram, o que significa que eles conseguiram alimentos e água na natureza.

Flamarion lembra que o impacto do fogo vai permanecer por anos a fio, já que o mais provável é que tenha causado desequilíbrios populacionais nas diversas espécies, como mortes de mais fêmeas ou machos, por exemplo. Além disso, com a destruição da vegetação, muitos animais ficaram sem casa e sem local para se refugiar durante o período de chuvas.

Com a mudança climática e as intervenções humanas na área de planalto do Mato Grosso, onde estão as nascentes dos rios que abastecem o Pantanal, a situação é considerada crítica pelos pesquisadores. Com clima cada vez mais seco e quente, a água vai deixando de ficar retida nos campos alagados da região.

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