quinta, 25 de abril de 2024
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CASAL DE TUIUIÚS ADOTA NINHO ARTIFICIAL NO PANTANAL

Após ninho queimado, nova casa é ocupada pela ave-símbolo do bioma

21 MAI 2021 - 13h06Por REDAÇÃO, COM INFORMAÇÕES DA EMBRAPA PANTANAL

Um dos cartões postais do Pantanal, localizado às margens da rodovia BR-262, no município de Corumbá, em Mato Grosso do Sul, pode se tornar um monumento vivo ao ser adotado pelo casal de tuiuiús – ave símbolo do bioma - que anualmente se reproduzia no ninho original, totalmente destruído pelas queimadas ocorridas em 2020.

O casal de tuiuiús voltou a encantar quem passa pelo local e têm sido observado já trazendo material para o novo ninho, como galhos e fibras vegetais mais finas. O ninho natural construído sobre a copa de um ipê roxo resistiu por décadas, inclusive um canteiro de obra ao se redor na implantação da rodovia, nos anos de 1980.

O antigo ninho havia sido tomado em 2011 como patrimônio pela prefeitura de Corumbá, por meio do decreto municipal 964. No entanto, não houve monitoramento do local na época das queimadas e o fogo destruiu a árvore e um símbolo de conservação, um dos mais interessantes atrativos turísticos da rodovia que corta o Pantanal.

Ninho na beira da rodovia pantaneira é um atrativo para quem trafega pelo bioma

O ipê é também uma das árvores símbolo do Pantanal, onde é mais conhecido como piúva. É uma das árvores mais altas da região e, pela sua copa aberta, é adequada para pousos e decolagens do tuiuiú, o que explica a alta frequência de ninhos nesta espécie. 

A piúva onde o ninho da BR-262 estava construído fica a uns 15 m do asfalto, e era uma referência turística nos períodos de reprodução. Sua perda em função dos incêndios catastróficos que atingiram 30% do bioma causou comoção, e o ninho artificial ora monitorado resgata essa referência para a região.

Construção do novo ninho

O ninho artificial foi instalado para oferecer uma alternativa ao casal. O fogo destruiu, além do ninho original, a estrutura de galhos que davam suporte a ele na piúva (nome pantaneiro do ipê) que ainda se mantém ao lado.

O ninho artificial vinha sendo monitorado desde a sua construção, em 23 de outubro de 2020. Em janeiro de 2021, os tuiuiús foram vistos nas proximidades e até pousados na árvore do antigo ninho. Já em 16 de maio deste ano, houve o primeiro registro do casal pousado no ninho artificial.

Além disso, Walfrido Tomás, pesquisador da Embrapa Pantanal e idealizador do projeto do ninho artificial, registrou o fato dos tuiuiús estarem trazendo material para o ninho, numa clara indicação que estão preparando o local para procriação. Isso confirma a adoção do novo ninho pelo casal, confirmando a esperança dos pesquisadores.

Ninho natural destruído pelo fogo: negligência do poder público ao não proteger o local das queimadas. Foto: Sílvio de Andrade

Walfrido conta que, durante o trabalho de levantamento de animais mortos pelas queimadas, realizado no ano passado, ele observou diversas vezes tuiuiús pousados em árvores próximas ao ninho que foi queimado cerca de um mês antes, e então teve a ideia de instalar uma estrutura alternativa para a um novo ninho.

“Assim os tuiuiús poderiam retornar, pois essas aves são fiéis ao local de nidificação", detalhou o pesquisador.

Monumento vivo: alerta

A proposta foi apresentada à Fundação de Meio Ambiente do Pantanal, que prontamente adotou a ideia, e estabeleceu uma parceria com a Energisa, empresa energética do Estado, para a instalação de uma estrutura próxima ao local do ninho original.

O Instituto Arara Azul foi também convidado a assinar o projeto, já que tem experiência com ninhos artificiais para araras azuis, na forma de caixas-ninho.

Segundo Tomás, essa é a primeira experiência de ninho artificial com espécie: “Me inspirei nos ninhos artificiais de cegonhas, comuns na Europa, já que o tuiuiú pertence à mesma família destas aves, sendo tecnicamente uma cegonha”.

O ninho construído possui estrutura que consiste de um poste de concreto de 12 metros, com uma plataforma hexagonal de metal de 2m de diâmetro no topo, em formato de taça, de forma a comportar o volumoso material que os tuiuiús utilizam na construção de ninhos.

“A estrutura foi adaptada e melhorada pelos técnicos da Energisa, utilizando material disponível, que são utilizados na construção de torres de redes de energia.  Sobre a plataforma, depositamos galhos e material fino para representar um ninho, na esperança de que o local fosse reconhecido pelos tuiuiús e utilizados como base para construção do novo ninho”, explicou o pesquisador.

Ninho artificial em construção no ano passado é sustentado por um super poste de concreto. Foto: Divulgação

Tomás defende que o ninho artificial não tem o papel de salvar a população de tuiuiús do Pantanal, já que não representa nada em uma população que já teve mais de 20 mil ninhos ativos na planície pantaneira nos anos 1990.

Para ele, o fato de ser um ninho artificial utilizado pela ave-símbolo do Pantanal, num local bastante visível às margens de uma movimentada rodovia, ele representa uma constante lembrança de que ações humanas equivocadas podem causar impactos profundos na fauna pantaneira e, por extensão, em toda a biodiversidade na região.

“Assim, este verdadeiro monumento vivo deve cumprir um papel relevante na conscientização da população sobre os cuidados a serem tomados nessa relação entre homem e natureza”, completa o pesquisador.

Filhotes nascem após cheia

Os tuiuiús se reproduzem após o período das cheias, quando o nível da água está baixando e os peixes e pequenos invertebrados – base da alimentação dessas aves - ficam mais disponíveis nas baías e alagados, servindo de alimento para a espécie.

Segundo os pesquisadores da Embrapa, geralmente os ninhos têm ovos ou filhotes entre julho e novembro e as cheias determinam a quantidade de ninhos ativos no Pantanal a cada ano.

Uma vez construídos os ninhos, os tuiuiús permanecem fiéis ao local de reprodução, o qual usam por muitos anos, sempre fazendo reparos e melhorias com a adição de galhos, capim e fibras de plantas aquáticas.

Esses ninhos podem ter mais de 2m de diâmetro, e são sempre colocados em grandes árvores com galhos abertos, para facilitar que as aves cheguem ao ninho com suas asas abertas, as quais podem ter 3m de uma ponta a outra.

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