quinta, 25 de abril de 2024

Tarumeiro do Rio Paraguai

21 JUN 2021 - 00h09Por ARMANDO ARRUDA LACERDA

Há muitos anos, quando Marli e eu assumimos a administração da Fazenda São Luiz, ela querendo melhorar a tradicional galinha com macarrão dos domingos, acrescentou um vidro de azeitonas ao molho...

Do comunicador do refeitório com a cozinha, veio a sentença dos maiores interessados: "Até que ponto tchega esta dgente nova, botá tarumã verde no macarraum."

Tempos depois, separados tarumeiro das oliveiras (apesar da parecença) incorporaram-se definitivamente as azeitonas ao Pantanal, até por indispensável no sarrabulho e nas saltenhas...

Diz-nos mestre Arnildo Pott que o tarumã é uma espécie   importante na sobrevivência no Pantanal e para a sobrevivência do Pantanal, com características medicinais e utilitárias; o Estado de Mato Grosso, a elegeu, por esses atributos, a sua árvore símbolo.

As margens dos rios têm o amarelo dos cambarás, o róseo das piúvas, o alaranjado matizado da canafistula, o laranja quase vermelho da abobreira o branco dos ingás e loros, pera aí! vamos nos ater nos roxos quase azuis do tarumã... 

Os tarumãs são muito comuns nas matas ciliares de rios e corixos, no jardim bem como nos fundos dos lotes projetados para Corumbá, diziam na época que quintais arborizados diminuíam a temperatura da cidade. Saímos de novo da trilha mas não deixamos nenhum tarumã urbano de fora!

Bem maduros, no ponto certo, devem ser colhidos do chão, lavados com uma cuia de folha de camalote, e consumidos numa medida espartana, só para aliviar...não matar a fome, deixe-as para engordar os inúmeros bichos de penas, pelos e escamas que dela dependem.

Ultimamente monetizaram tudo no Pantanal, área muito cheia, área muito seca, campo, savana, mato, mata, gente fragilizada, gente esperta, incêndio, bicho vivo, bicho morto, enfim, um grande passivo desvalorizado, aguardando a disparada das Bolsas...

Confesso que consegui monetizar esse tarumã defunto, hoje a lembrar um retrato de Dom Quixote...

Tarumeiro florido

Rogério Widal, me mostrou e contou sua história. Nas grandes enchentes ele sempre tinha um pequeno murundu em volta do seu pé, para acomodar os viajantes e esquentar a matula.

Durante todos os nossos anos de observadores de pássaros, ele deslumbrou muitos turistas, seja pelos favos amarelos entrevistos no oco de um galho, a quem chamavam de killer bees, mas que nunca nos incomodaram...

Árvore antiga, muito frondosa sempre tinha um pica-pau a forragear em algum galho seco, para deslumbramento dos observadores havia um revezamento das espécies que se alternavam.

Quando estava florido ou com frutas atraía aves de todo tipo, do alto e do chão, de todos os tamanhos, tanto em busca das flores como dos insetos, e muitos, muitos beija-flores!

Que, muito brigões, também se revezavam entre tipos diferentes, enfim este tarumeiro foi filmado, fotografado, como peça principal ou secundária por todos os fotógrafos e observadores de pássaros que nos visitavam, instantes eternos para quem aprecia a vida selvagem.

Já vi muitos tarumeiros que morreram em muitos lugares da mata ciliar do Rio Paraguai, aguardo a próxima florada para ver os que sobraram, mas não me conformo ao ver, pelas lentes da Luiza Lacerda, a última mensagem de meu velho amigo tarumeiro...

Tão perto da água mesmo na seca, tão fácil de molhar e diminuir a potência das chamas para não incinerá-lo, num derradeiro gesto aponta a direção da água do Rio Paraguai!

Lá no Porto São  Pedro, sejamos ouvidos ou não, vamos fechar as matas ciliares e tentar, dentro do possível, molhar com bomba a partir de um barco para ativar o banco de sementes  do solo, talvez nasça  um filho do velho tarumeiro e das outras árvores, substituídas para as novas gerações de gentes e bichos de pelo, escamas ou penas!

Investir em regar o que tá seco é a única alternativa sensata... Baum, num carece esperar incêndio para ajudar o Pantanal, bando de dgente tarová!

Adiscurpem o acontecido e tratodia tarumeiro velho!

(*) Pantaneiro, de chapa e cruz

 

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