Primeiro ato.
O poeirão e o estalar de readores anunciam a chegada do gado ao último pouso em terras paiaguenses. O repicar do berrante dita os procedimentos. Naquela noite, os rumores de chifres se chocando e o bramido dos touros jofreanos encheriam de preocupação os pensamentos do experiente condutor. Somente o cantar do galo e a barra do dia trariam de volta a confiança ao velho capataz. O mate quente e a prosa com os companheiros ao redor do fogo acalmariam finalmente seu espirito.
Rapidamente, tudo estará pronto. O gado agora está quieto e se ouve um ou outro movimento da boiada na penumbra dos currais.
Deixando de lado a cuia de erva carinhosamente cevada por sua esposa e companheira de lutas, aquela figura emblemática da epopeia pantaneira observa a paisagem e com o seu conhecido sotaque paraguaio comanda:
" vamos companheirada, vamos jogar boi n'água!"
Dali em diante assumiria o seu papel.
Canoas a postos, peonada atenta, o ponteiro faz um floreio com o berrante e em seguida chama a boiada ao seu comando. Tudo se torna pura magia. Os sinuelos caem no rio e os bois bravios dos pantanais poconeanos seguem obedientes. Exímios canoeiros "cabecereiam" o gado que vai serpenteando nas correntezas do velho Taquarí em busca das terras nhecolandenses.
É um raro espetáculo onde se percebe a maestria da nossa gente e a pujança da pecuária pantaneira.
Mas, parece que o destino da humanidade é perder o paraíso. Já acontecera no início da Criação.
Cai o pano.
Segundo ato.
Os jipeiros atravessam alegremente aquilo que um dia foi um rio. Passam descuidados por sobre a História.
Dois grandes esteios de aroeira testemunham um passado de riquezas. Curiosos se perguntam: o que seriam aquelas estruturas tão fortes afogadas no areial?
São vestígios de um povo heroico em vias de extinção.
Cai o pano
Fim.
(*) Pecuarista pantaneiro e paiaguense
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