Há alguns anos, por volta do final de 1990, encontrava-me no Aeroporto de Guarulhos aguardando demorada conexão noturna, eis que adentra a sala de espera, pilhada comitiva de ambientalistas militantes antihidroviaristas, tanto do MT como do MS.
Fui me refugiar da algazarra na lanchonete, descoberto, um deles separou fotocópias grampeadas e gritou: "Eis a prova!”. Gritou batendo-a na mesa, como um zap no jogo de truco. "Eis a certidão de óbito da hidrovia, fomos acompanhar a apresentação do próprio Steve Hamilton, ontem na América do Norte!".
Agradeci, desejei sucesso e sopesando as páginas desse resumo, evadi-me do recinto, agora atopetado dos convidados especiais da viagem internacional, ostentando camisetas e mochilinhas da Ong que então dava as cartas em MS e MT.
Dediquei boas horas a interpretar o tal estudo do Hamilton, que nos seus 2/3 iniciais era um deslumbramento de dados científicos e imagens inovadoras de satélite, infelizmente no seu final tornara-se um vitriólico panfleto anti hidrovia, mostrando um claro viés de demonizar qualquer tipo de atividade no Pantanal, só admitindo que fosse uma enorme reserva para lazer e pesquisa, como previsto no SNUC (Sistema Nacional de Unidades de Conservação).
Décadas mais tarde, numa Audiência Pública montada por membros da Justiça Federal, em Cáceres, onde o ponto culminante seria aguardada Sentença Judicial que paralisaria definitivamente os embarques de soja em Cáceres, onde atuava temporariamente como operador portuário do terminal privado local, Docas de Mato Grosso.
Nos chavões e platitudes anti hidroviaristas, se repetia como slogan que agora tinham uma "verdade científica absoluta", fato que me fez recordar da velha conclusão do cientista Hamilton, recebida em São Paulo, que advertira que sua análise científica NÃO deveria servir como conclusão científica absoluta.
Eis que o zeloso guardião oficial do meio ambiente foi confrontado se o estudo que baseara sua vibrante peça jurídica, fora citação oriunda de uma tradução juramentada de qual publicação cientifica...
Indagado, o chefe da claque que urrava e vibrava até então, respondeu que era tradução livre, num acesso repentino, a autoridade exigiu aos gritos a tradução juramentada em 24 horas e cancelou a reunião, transformando a portentosa comemoração aguardada, num fiasco monumental.
Por omissão de um não na tradução, os arteiros ambientalistas fizeram trampolinagem, ampliando indevidamente o escopo de trecho do trabalho publicado, o mesmo ocorrendo agora com o MAP BIOMAS, onde terceiros, por pura concupiscência, ampliam trechos para anunciar desastres iminentes no Pantanal, por diminuição da superfície de água.
A sustentabilidade da tradicional pastorícia pantaneira, forte conexão histórica entre trabalho e natureza, está contemplada na Nota Técnica Map Biomas de 25.01.2024, intitulada Conservação da Planície e do Planalto da Bacia Hidrográfica do Alto Paraguai, que separa o Planalto adjacente e sua evidente degradação, da conservação e integridade vigentes em toda a planície.
Qualquer imagem do FIRMS (Fire Information for Resource Management System) da NASA informaria a quem conhece suas escondidas localizações, que na planície o fogo só vira incêndio descontrolado, nos Parques Governamentais e particulares, bem como nas Rppns e Reservas, principalmente nas suas próprias matas ripárias e Apps.
Publicado o Informativo n°13/CICOE-PEMIF/2024 do CBM-MS reiteramos que os incautos deveriam deixar a ciência e os pantaneiros em paz! Iniciemos a recuperação do Pantanal por uma auditoria técnica, ambiental e judicial dos incêndios dos últimos 5 anos, com punição dos culpados, que deveriam ressarcir os recorrentes prejuízos que, repetidamente, impuseram aos cofres públicos na tentativa de controlar os incêndios a que deram causa.
Dois amigos ambos thomas, um com S outro com Z, pesquisadores que me enriquecem com suas discordâncias, enviam-me costumeiras colaborações, agradeço hoje as lições de "Você é um ambientalista ou trabalha para se sustentar: trabalho e natureza", de Robert White, por explorar o grande enigma que o Pantanal tradicional já respondeu no seu modo de viver, ao compatibilizar, por séculos, trabalho e atividade econômica com a sustentabilidade da natureza...
O Pantanal, portanto, expõe: "Onde se cria gado, o fogo não se cria", formalizando publicamente que os pantaneiros, usuários comportados dos dados satelitais, aceitando portanto o agradecimento que Tasso Azevedo, do Map Biomas, fez em Davos, no Fórum Econômico Mundial : "Trabalhando junto, conosco , para construir um mundo, onde as pessoas e a natureza possam prosperar juntas."
(*) Pantaneiro do Porto São Pedro, Amolar, Corumbá (MS)
Leia Também
Da quintessência
Afinal, qual a idade de Mato Grosso do Sul: 46, 500 ou 12.400 anos?
Lula e seu chapéu
SOS Surreal, crônica da morte anunciada insistentemente do Pantanal.
MS 500 anos: de Piabiru à Bioceânica