quarta, 24 de abril de 2024

Estatização privada do Pantanal

13 NOV 2021 - 11h30Por ARMANDO ARRUDA LACERDA

Com apenas um dia de "Convenção", eis que nos chega a notícia do esclarecimento do ponto fulcral da movimentação por um novo Estatuto do Pantanal!

"Assim, propõe alteração no artigo 36 da norma 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, de modo a dar preferência, na compensação ambiental de empreendimentos sujeitos a estudos de impacto ambiental, a unidades de conservação localizadas no bioma impactado pelo empreendimento, sendo este um critério justo de repartição de ônus e benefícios."

Agora, se compreende o açodamento dos convênios e cartas de intenções levados às pressas, a Glasgow para "salvar" o Pantanal.

Objetivamente, só terão direito às compensações, créditos, mundos e fundos ambientais os empreendimentos sujeitos a EIA RIMA e as unidades de conservação, a talante do agente público de plantão.

Os pantaneiros, desde que começou este sazonal, natural e esperado evento de período de seca, reivindicam perícia técnica sobre as ações e omissões do Estado quanto à conservação do Pantanal nas últimas décadas de ciclo de enchentes.

Pouquíssimas ações, das muitas e dispendiosas levadas a efeito pelo Estado, em suas múltiplas feições, que possam ser submetidas a uma perícia ambiental isenta e técnica e auferir resultados positivos.

Ainda hoje, com os rios morrendo por assoreamento e falta d'água na Planície, ainda há quem combata segurar sedimentos no Planalto, determinando que devem continuar a matar os rios, sem cogitar sequer estudar represas para minorar o aporte de areia ao Pantanal.

O Código Florestal parecia ter sido feito à medida para o Pantanal, o bioma dos biomas, podendo compensar reservas e prestar serviços ambientais para quase todos os outros biomas.

Os créditos de compensação pela fixação do carbono, também pareciam feitos sob medida para o Pantanal, que, como todos sabem, tem excepcional rapidez no crescimento de seus vegetais, velocidade requerida para otimização da fixação do carbono.

O desaparecido prefeito de Corumbá, Ruiter Cunha de Oliveira, excepcional tributarista e conhecedor do Pantanal, através da Lei Municipal denominada Lei Ruiter , priorizou para a região do Taquari e suas  comunidades ribeirinhas,  colônias tradicionais e proprietários rurais todas as compensações e pagamentos iniciais por prestação de serviços  ambientais.

Aparentemente, a derrota no ano passado nas audiências públicas do tal Estatuto nas cidades pantaneiras, levou as assessorias, de olho nos ditames da Lei Ruiter, a produzir este Frankestein legal, consolidado no parágrafo acima, de má fé patética.

Todo o atraso nas compensações de reserva legal e prestação de serviços ambientais entre os estados brasileiros, prende-se a esta trava aplicada para favorecer parques, rppns, apas e quejandas invencionices e "investimentos", em detrimento dos pantaneiros, e do Pantanal, 95% escriturado e legalizado.

Pasmem!  Em alguns casos, o comprador e doador poderia obter até anistia por danos ambientais pretéritos, bastando atender corretores e "investidores", comprar a área indicada e doar para o Estado.

Evidente, que um mínimo de lucidez ou assessoria jurídica, ao feliz comprador, aponta que danos ambientais são imprescritíveis legalmente, podendo tal transação de compra-venda-doação ser questionada a qualquer tempo e, ainda, eventuais anistias, podem não subsistir em mudanças de diretrizes governamentais.

Embora aparentemente não seja visível aqui em Pindorama, o tal carbono equivalente por hectare, constitui-se numa commoditie e os clientes no exterior preferem aplicar com os verdadeiros Guardiões Privados do Pantanal, e não com projetos sacados de conhecidas algibeiras de "consultores especialistas".

Adquirido o carbono equivalente por hectare, quem vai cuidar perpetuamente desse hectare criando seu gadinho bombeiro, afastando a caça e pesca ilegais, coibindo outras atividades ilegais, a não ser quem o vem fazendo, graciosamente, há centenas de anos?

O mercado não quer tratar com reservas e parques, sempre parques de diversões dos incêndios e das atividades ilícitas a cobrir sua omissão por eterno chororô por mais verbas ou carências e desmontes disto ou daquilo.

Já optou, há anos, por aguardar a definição pelos proprietários tradicionais, que sabem que vai zelar por tudo. Perenidade só faz sentido a quem passa a seus filhos e netos, o amor pelas inconstâncias, que são a essência do Pantanal, independentemente de ser remunerado para isso.

Por favor, governos, legisladores e Poder Judiciário, parem de ouvir concupiscentes narrativas que só atrapalham o Pantanal, ouvindo somente quem, a pretexto de preservar, tem quarenta anos de destruição no inventário!

Vamos chegar, sentemo-nos humildemente em roda, despidos de dogmas prévios e abram corações e mentes para entender o tamanho do nosso comprometimento e amor pela conservação perpétua do Pantanal.

(*) Pantaneiro, do Porto São Pedro

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